domingo, 19 de fevereiro de 2012

LITERATURA: DANTE: A DIVINA COMÉDIA

BIOGRAFIA:Dante
De nome completo Dante Alighieri, foi poeta, escritor, teórico literário, filósofo moralista e pensador político. Nasceu em 1265 no seio de uma família nobre de Florença, cidade onde cresceu e mais tarde desempenhou parte ativa nas lutas políticas que dividiam a cidade entre o partido dos Guelfos Brancos e o partido dos Gibelinos, chegando mesmo a assumir um cargo administrativo durante a vigência do seu partido, entre 1295 e 1301. No entanto, um ano depois, viu-se obrigado a fugir de Florença, em resultado da vitória do partido dos Gibelinos (apoiados pelo papa), vindo a ser mais tarde acolhido pela cidade de Ravenna. Dante casou com Gemma Donati, mas toda a sua vida e obra poética se inspiraram no amor espiritual que nutria por Beatriz Portinari (falecida em 1290), que tinha conhecido quando ambos eram crianças. Essa inspiração encontrou a sua expressão máxima na obra La Vita Nuova. Nesta obra são contadas, quer em verso, quer em prosa, todas as venturas e desventuras do relacionamento entre Dante e Beatriz, desde que se conheceram até à morte dela. Aliás, os textos em prosa servem sobretudo para interligar o que Dante escreveu ao longo de 10 anos (1283-1293): 25 sonetos, uma balada e cinco canções, uma delas incompleta pela morte de Beatriz. O desaparecimento físico da sua amada constitui um ponto de viragem na escrita de Dante. Influenciado pela poesia intelectual, mesmo filosófica, de Guido Guinizelli (seu contemporâneo), Dante abraça a filosofia, estudando profundamente os textos de Boécio e de Cícero, ao mesmo tempo que participa em discussões filosóficas realizadas em escolas religiosas, o que torna a sua escrita mais rigorosa, quase severa. Esta nova vertente literária foi refletida em Il Convivio, escrito entre 1304 e 1307, uma obra inicialmente projetada para quinze livros, dos quais apenas quatro foram concebidos. Duas ideias fundamentais se retiram desta obra: a defesa da utilização do vernáculo na literatura nacional e a maturação das ideias políticas do autor, através da defesa da tradição imperialista, mais concretamente do Império Romano. A primeira ideia é reflexo da influência do seu maior amigo, Guido Cavalcanti, acérrimo defensor da linguagem vernacular, com o qual Dante trava conhecimento no início da sua carreira literária. Esta tese sai reforçada com a obra De Vulgari Eloquentia, inteiramente dedicada ao estudo da língua, escrita entre 1305 e 1308, ou seja, praticamente em simultâneo com Il Convivio. A segunda não é mais que pôr em prática os conceitos teorizados por Bruneto Latini, considerado por Dante como o seu grande mentor. É, aliás, Latini quem induz em Dante o gosto pela política, o conceber o Homem como um ser social e político, fazendo a ligação entre os seus pensamentos políticos e o seu entendimento sobre a ambição humana. O seu envolvimento na política atinge o auge entre 1308 e 1310, quando o papa francês, Clemente V, proclama como rei dos romanos o Conde de Luxemburgo, Henrique. A ideia de haver novamente um imperador motiva-o a intensificar as suas intervenções políticas, já que a encarava como a concretização de um ideal supremo. Contudo, o recuo de Clemente V nos seus intentos provocou a maior desilusão política de Dante, levando-o a escrever uma das suas mais polémicas obras, De Monarchia (1313), onde elege como alvo dos seus argumentos o conceito de que toda a autoridade política emanava da figura do papa, procurando assim justificar o seu desejo de um império italiano onde, apesar da dualidade Providencial (felicidade na terra e felicidade eterna), as duas autoridades - espiritual e política - não se confundem, mas atuam paralelamente, ou seja, o espírito ilumina a ação governativa. Destaque, ainda, para duas obras: Le Rime (contemporânea do Il Convivio), composta por sonetos, canções, baladas e sextinas em que os temas de amor e de alegria louvam a ciência e a filosofia; e As Epístolas, Éclogas e Quaestio de aqua et terra, um conjunto de documentos escritos ao longo da sua vida que de certa forma espelham aspetos pessoais do autor, como o infortúnio de ser exilado ou o interesse perante a ciência astronómica e a própria física. Os anos de exílio revelaram-se para Dante difíceis de suportar, apesar de ter sido sempre acolhido solenemente pelas casas nobres das diferentes cidades por onde passou. Terá sido durante este período da sua vida (mais concretamente entre 1308 e 1321) que Dante escreveu a sua mais famosa obra, A Divina Comédia, onde um homem percorre os três estádios pós-morte: o Inferno, o Purgatório e o Paraíso. Dante morre pouco depois de concluir esta obra, tendo um funeral com todas as honras dado pelos mais ilustres intelectuais da época.
A OBRA:
Divina Comédia
Considerada a obra-prima de Dante Alighieri, A Divina Comédia é um poema escrito em tercetos, com três partes fundamentais (o Inferno, o Purgatório e o Paraíso), cada uma com 33 cantos, havendo mais um canto que é considerado a introdução à obra. A Comédia foi o título escolhido por Dante, opção que ele justificava, numa epístola endereçada a Cangrande della Scala, por a ação dramática, agitada e terrível no Inferno, tornar-se serena e jubilosa no Paraíso, para além do facto de a obra ser escrita em vernáculo e não em latim. A designação "Divina" só surge aquando da edição veneziana de 1555, por influência do estatuto que Dante obteve no seio do mundo artístico, o de "divino poeta".O enredo do poema consiste na viagem que um homem (consensualmente julgado como sendo o próprio Dante) realiza pelos três estádios pós-morte: o Inferno, o Purgatório e o Paraíso, no ano de 1300, desde a Sexta-Feira Santa até alguns dias depois do domingo de Páscoa. Nesta viagem, Dante tem dois guias: o poeta Virgílio e Beatriz. Virgílio conduz Dante pelos nove círculos do Inferno, onde o poeta encontra várias personalidades famosas do seu tempo, como Filipo Argenti, Piero delle Vigne e Brunetto Latini. A primeira etapa da viagem, marcada pela tragédia e pelo sofrimento, constitui um ato necessário à reabilitação espiritual, onde Dante constata o quão prejudiciais eram as suas crenças terrenas. Guiada ainda por Virgílio, a viagem prossegue então pelo Purgatório, onde ocorre de facto o despertar espiritual de Dante que, ao reprimir a sua personalidade, ascende ao Paraíso Terrestre (o derradeiro dos nove níveis do Purgatório), local do tão esperado encontro com Beatriz, que o conduzirá à última etapa desta viagem: o Paraíso. Aqui, Dante atinge a sua realização espiritual, caminhando lado a lado com Beatriz através dos nove céus do Paraíso até chegar ao Empíreo, onde reside a glória de Deus.A Divina Comédia, como corolário de toda a vida literária de Dante, está carregada de simbolismo, por exemplo, o facto de o enredo começar na Sexta-feira Santa, ou seja, fazer coincidir a morte de Dante com a própria morte de Jesus Cristo; a escolha dos guias para a viagem (Virgílio, poeta do Império Romano e autor da descida de Eneias ao Inferno, era uma das maiores referências de Dante, o único capaz de lhe dar instrução moral e de constituir um autêntico emissário da graça divina; e Beatriz, que foi o maior amor da vida de Dante, constituiu uma autêntica referência e musa inspiradora ao longo da sua obra, sendo, portanto, a pessoa ideal para o conduzir ao Empíreo); e, por fim, o próprio facto de a peregrinação de Dante pelos três estádios ultramundanos refletir o período de exílio quase nómada do poeta.Saliente-se, ainda, que Dante insere na história os seus próprios ideais políticos, filosóficos, morais e históricos, sobretudo a partir do Purgatório, onde se torna uma personagem participativa, evoluindo da passividade que o caracterizava no Inferno. Neste sentido, Dante não só transmite uma imagem da época em que vive, como também abre caminho para que a obra se torne universal.O reconhecimento das qualidades únicas de A Divina Comédia não tardou e em 1373-74 Giovanni Boccaccio, após ter escrito a biografia do poeta, dava aulas que incidiam no estudo daquela obra, enquanto que por volta de 1400 já lhe tinham sido dedicados doze comentários detalhadamente elaborados por vários intelectuais. Ao longo dos séculos, esta obra ganhou um estatuto cada vez maior, ou por refletir, de uma maneira ou de outra, diferentes aspetos da sociedade, ou pelo facto de a sua arquitetura formal única e riqueza poética sobreviverem às diferentes escolas de arte.

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