A cartografia pode ser considerada como a "técnica de representar num plano, pelo desenho, uma parte ou a totalidade da Terra". Como esta é quase esférica, a cartografia criou convencionalismos de forma a poder cumprir o seu objeto científico. Existem assim três categorias de cartas produzidas na cartografia: as cartas equidistantes (respeitam-se as distâncias entre os lugares representados, depois de reduzidas a uma determinada escala); as cartas equivalentes (todas as áreas representadas numa dada proporção, mas sem manter distâncias e áreas); e as cartas conformes (conservam os ângulos, mas sem respeitarem as distâncias e as áreas).
As primeiras representações cartográficas encontram-se na Geografia de Cláudio Ptolomeu, do século II d. C., embora só no século XV tenha sido conhecida no ocidente. Não sendo pioneiro, pois o que se fez seguramente antes dele se perdeu, as suas projeções foram quase esquecidas na Idade Média, quando a cartografia pouco mais era do que esboços sem qualquer valor geográfico, com desenhos oblongos ou até circulares em representação da Terra a marcarem a época. A carta-portulano, ou carta náutica mediterrânica, que surgiu no século XIII, trouxe um influxo novo à ciência cartográfica medieval, revolucionando-a. Juntamente com o crescente conhecimento da obra de Ptolomeu e graças também à medição de latitudes aproximada dos lugares recém-descobertos pelos portugueses, principalmente, ao longo do século XV, bem como à "invenção" da imprensa de caracteres móveis, a cartografia conheceu um grande desenvolvimento, revendo-se e atualizando-se constantemente, até se chegar à nova conceção de representação plana da terra por Mercator, sem dúvida o momento de viragem para a cartografia científica. Retomando os protulanos, estes eram cartas geográficas provavelmente de origem genovesa, veneziana ou maiorquina em que os nomes dos portos, escritos perpendicularmente à costa, formam um desenho com a configuração dos países marítimos. De acordo com o maior historiador de sempre dos Descobrimentos portugueses, o saudoso Prof. Luís de Albuquerque, a "carta-portulano foi desenhada (...) a partir de distâncias estimadas pelos pilotos e dos rumos indicados pela bússola".
As maiores escolas de cartografia medievais foram as de Maiorca e da Catalunha, famosas precisamente pelos seus portulanos, que eram encomendados por todos os países da Europa Ocidental e Mediterrânica. Recorde-se aqui que Pedro IV de Aragão em 1354 ordenou aos capitães dos seus navios que tivessem sempre em cada um deles pelo menos duas dessas cartas marítimas, para além de não nos esquecermos também do célebre portulano catalão encomendado por Carlos V de França em 1375. os portulanos destinavam-se essencialmente à técnica de navegação dominante na Idade Média, a de cabotagem, à vista da costa portanto. Mas as viagens ao largo começavam já a aparecer também, graças a estes desenvolvimentos da cartografia.
Depois de Mercator, entretanto, tudo se modificou, aparecendo as cartas cilíndricas e cónicas, por exemplo, e a cartografia ganhou uma projeção imparável e cada vez mais dotada de exatidão e cientificidade indiscutíveis. Mas para o trabalho de Mercator ter surgido e para todo esse desenvolvimento cartográfico se ter registado, um feito há que é incontornável como grande condicionante: os Descobrimentos portugueses e também espanhóis e italianos, numa escala mais reduzida. A cartografia portuguesa surgiu cerca de setenta anos depois da aventura da Expansão ter começado, se a tomada de Ceuta for entendida como a data do seu começo (1415). Esta ideia, lançada por Charles Verlinden em 1985, atesta que a cartografia portuguesa até essa data não existia e que, por conseguinte, as cartas utilizadas eram feitas por cartógrafos estrangeiros ou em escolas fora de Portugal, o que não será custoso de acreditar. E mesmo as que se fizeram até fins do século XV não foram mais do que pouco mais do que uma mão cheia, se tantas, pois nem todas estão datadas... Curioso por isso de referir que a ciência cartográfica em Portugal não acompanhou o esforço de navegação (viagens, técnicas, instrumentos de orientação, etc.) e as explorações realizadas ao longo da costa africana ocidental. A qual recorde-se igualmente surge nessa época, até 1485, cartografada em cartas estrangeiras, como as de Grazioso Benincasa, Cristóforo Soligo Henricus Martellus Germanus, que cartografou c. 1489-90, por exemplo, as viagens de Diogo Cão a Angola e de Bartolomeu Dias ao Cabo da Boa Esperança. Citando uma vez mais Luís de Albuquerque, a política de sigilo não deveria ser assim tão hermética, muito pelo contrário, a avaliar por estas produções cartográficas, dotadas de rigor diga-se.
As cartas portuguesas do século XV são essencialmente de matriz maiorquina. Autores dessas cartas-portulanos (com alongamentos na costa africana, mas em tudo idênticas na técnica de desenho às da "escola de Maiorca"), salientem-se pelo menos os de Pedro Reinel (carta de 1485) e de Jorge de Aguiar (de 1492), para além do anónimo autor da "carta de Modena" (da mesma época, sensivelmente). Ter-se-á que esperar pelo século XVI, o século da "carreira da Índia", do Oriente, dos cheiros e riquezas de Goa e de outros lugares do Índico, para se assistir a um grande incremento da cartografia portuguesa. Era o fim também da cartografia ptolomaica, em desacordo com as representações das "novas" terras descobertas ou exploradas pelos portugueses. Aumentam as massas continentais e surge o emaranhado das ilhas da Insulíndia nas cartas portuguesas, mas sem ainda grandes inovações técnicas. Surgem também as escalas de latitudes nas cartas (com exceção do chamado planisfério de Cantino), devido à sua medição a bordo dos navios. A carta náutica estava no seu auge então, mas as imprecisões apontadas eram cada vez mais, críticas nem sempre feitas com rigor ou método científico. Daí que Pedro Nunes tenha defendido as cartas de marear. Surgiram as escalas oblíquas, como na carta de Pedro Reinel de c. 1504, para tentar corrigir erros de cálculo da deformação esférica da Terra.
A cartografia portuguesa quinhentista foi importante graças à amplitude de conhecimentos que proporcionou ao conhecimento geográfico da Terra, influenciando toda a produção cartográfica europeia da época. Os aperfeiçoamentos de representação de terras são evidentes e até rápidos. Cartógrafos famosos na Flandres ("escola" muito importante na segunda metade do século XVI), como Ortelius, depois de Waldseemueller e de Cavério, beberam da cartografia portuguesa quinhentista. Entre os séculos XV e XVII produziram-se em Portugal quase 300 cartas, o que comprova essa vitalidade da cartografia portuguesa na época dos Descobrimentos, mais fulgurante sem dúvida no século XVI, quando provavelmente terá sido a mais notável da Europa, contando com o concurso de inúmeros cartógrafos não só portugueses mas também centro-europeus e judeus, para além do apoio interdisciplinar de matemáticos e astrónomos, principalmente.
As primeiras representações cartográficas encontram-se na Geografia de Cláudio Ptolomeu, do século II d. C., embora só no século XV tenha sido conhecida no ocidente. Não sendo pioneiro, pois o que se fez seguramente antes dele se perdeu, as suas projeções foram quase esquecidas na Idade Média, quando a cartografia pouco mais era do que esboços sem qualquer valor geográfico, com desenhos oblongos ou até circulares em representação da Terra a marcarem a época. A carta-portulano, ou carta náutica mediterrânica, que surgiu no século XIII, trouxe um influxo novo à ciência cartográfica medieval, revolucionando-a. Juntamente com o crescente conhecimento da obra de Ptolomeu e graças também à medição de latitudes aproximada dos lugares recém-descobertos pelos portugueses, principalmente, ao longo do século XV, bem como à "invenção" da imprensa de caracteres móveis, a cartografia conheceu um grande desenvolvimento, revendo-se e atualizando-se constantemente, até se chegar à nova conceção de representação plana da terra por Mercator, sem dúvida o momento de viragem para a cartografia científica. Retomando os protulanos, estes eram cartas geográficas provavelmente de origem genovesa, veneziana ou maiorquina em que os nomes dos portos, escritos perpendicularmente à costa, formam um desenho com a configuração dos países marítimos. De acordo com o maior historiador de sempre dos Descobrimentos portugueses, o saudoso Prof. Luís de Albuquerque, a "carta-portulano foi desenhada (...) a partir de distâncias estimadas pelos pilotos e dos rumos indicados pela bússola".
As maiores escolas de cartografia medievais foram as de Maiorca e da Catalunha, famosas precisamente pelos seus portulanos, que eram encomendados por todos os países da Europa Ocidental e Mediterrânica. Recorde-se aqui que Pedro IV de Aragão em 1354 ordenou aos capitães dos seus navios que tivessem sempre em cada um deles pelo menos duas dessas cartas marítimas, para além de não nos esquecermos também do célebre portulano catalão encomendado por Carlos V de França em 1375. os portulanos destinavam-se essencialmente à técnica de navegação dominante na Idade Média, a de cabotagem, à vista da costa portanto. Mas as viagens ao largo começavam já a aparecer também, graças a estes desenvolvimentos da cartografia.
Depois de Mercator, entretanto, tudo se modificou, aparecendo as cartas cilíndricas e cónicas, por exemplo, e a cartografia ganhou uma projeção imparável e cada vez mais dotada de exatidão e cientificidade indiscutíveis. Mas para o trabalho de Mercator ter surgido e para todo esse desenvolvimento cartográfico se ter registado, um feito há que é incontornável como grande condicionante: os Descobrimentos portugueses e também espanhóis e italianos, numa escala mais reduzida. A cartografia portuguesa surgiu cerca de setenta anos depois da aventura da Expansão ter começado, se a tomada de Ceuta for entendida como a data do seu começo (1415). Esta ideia, lançada por Charles Verlinden em 1985, atesta que a cartografia portuguesa até essa data não existia e que, por conseguinte, as cartas utilizadas eram feitas por cartógrafos estrangeiros ou em escolas fora de Portugal, o que não será custoso de acreditar. E mesmo as que se fizeram até fins do século XV não foram mais do que pouco mais do que uma mão cheia, se tantas, pois nem todas estão datadas... Curioso por isso de referir que a ciência cartográfica em Portugal não acompanhou o esforço de navegação (viagens, técnicas, instrumentos de orientação, etc.) e as explorações realizadas ao longo da costa africana ocidental. A qual recorde-se igualmente surge nessa época, até 1485, cartografada em cartas estrangeiras, como as de Grazioso Benincasa, Cristóforo Soligo Henricus Martellus Germanus, que cartografou c. 1489-90, por exemplo, as viagens de Diogo Cão a Angola e de Bartolomeu Dias ao Cabo da Boa Esperança. Citando uma vez mais Luís de Albuquerque, a política de sigilo não deveria ser assim tão hermética, muito pelo contrário, a avaliar por estas produções cartográficas, dotadas de rigor diga-se.
As cartas portuguesas do século XV são essencialmente de matriz maiorquina. Autores dessas cartas-portulanos (com alongamentos na costa africana, mas em tudo idênticas na técnica de desenho às da "escola de Maiorca"), salientem-se pelo menos os de Pedro Reinel (carta de 1485) e de Jorge de Aguiar (de 1492), para além do anónimo autor da "carta de Modena" (da mesma época, sensivelmente). Ter-se-á que esperar pelo século XVI, o século da "carreira da Índia", do Oriente, dos cheiros e riquezas de Goa e de outros lugares do Índico, para se assistir a um grande incremento da cartografia portuguesa. Era o fim também da cartografia ptolomaica, em desacordo com as representações das "novas" terras descobertas ou exploradas pelos portugueses. Aumentam as massas continentais e surge o emaranhado das ilhas da Insulíndia nas cartas portuguesas, mas sem ainda grandes inovações técnicas. Surgem também as escalas de latitudes nas cartas (com exceção do chamado planisfério de Cantino), devido à sua medição a bordo dos navios. A carta náutica estava no seu auge então, mas as imprecisões apontadas eram cada vez mais, críticas nem sempre feitas com rigor ou método científico. Daí que Pedro Nunes tenha defendido as cartas de marear. Surgiram as escalas oblíquas, como na carta de Pedro Reinel de c. 1504, para tentar corrigir erros de cálculo da deformação esférica da Terra.
A cartografia portuguesa quinhentista foi importante graças à amplitude de conhecimentos que proporcionou ao conhecimento geográfico da Terra, influenciando toda a produção cartográfica europeia da época. Os aperfeiçoamentos de representação de terras são evidentes e até rápidos. Cartógrafos famosos na Flandres ("escola" muito importante na segunda metade do século XVI), como Ortelius, depois de Waldseemueller e de Cavério, beberam da cartografia portuguesa quinhentista. Entre os séculos XV e XVII produziram-se em Portugal quase 300 cartas, o que comprova essa vitalidade da cartografia portuguesa na época dos Descobrimentos, mais fulgurante sem dúvida no século XVI, quando provavelmente terá sido a mais notável da Europa, contando com o concurso de inúmeros cartógrafos não só portugueses mas também centro-europeus e judeus, para além do apoio interdisciplinar de matemáticos e astrónomos, principalmente.
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