Mare Clausum
Os portugueses enfrentaram, desde o início dos Descobrimentos, a cobiça castelhana, cuja Coroa reinvindicava a posse de algumas das terras descobertas pelos navegadores ao serviço do rei de Portugal. A questão da posse das Canárias é o caso com maior expressão das querelas territoriais luso-castelhanas. A sua posse, decidida a favor de Castela, apenas se legitimará no Tratado de Alcáçovas. Nesse mesmo encontro entre os dois países, em 1479, demarcaram-se também as zonas marítimas de Portugal e de Castela. Assim, as terras descobertas a sul das Canárias ficariam para Portugal, que passava a deter igualmente o exclusivo do comércio na região, ficando Castela com idênticas condições mas a norte daquele arquipélago atlântico. Sanavam-se os conflitos entre os dois reinos e findava a ingerência castelhana na Guiné e seu comércio.Afirmava-se, por outro lado, o princípio do Mare Clausum (mar fechado), que consagrava e reservava o direito de posse e navegação a quem descobrisse qualquer terra ou rota marítima. O Tratado de Tordesilhas, em 1494, dois anos após a chegada de Colombo à América, irá reforçar o princípio do Mare Clausum saído do Tratado de Alcáçovas. Assim, entendem as monarquias ibéricas, revendo as posições assumidas em 1479, dividir o mundo pelos seus dois reinos a partir do meridiano que passa a 370 léguas a ocidente do arquipélago de Cabo Verde. A oeste desse meridiano, ficariam as possessões espanholas; a leste, as portuguesas.Este esforço clarificador que foi o Tratado de Tordesilhas resultava das reivindicações portuguesas em relação aos territórios que Colombo teria descoberto em 1492 ao serviço dos Reis Católicos de Espanha. D. João II de Portugal afirmava, então, que essas terras se situavam, à luz das conclusões de Alcáçovas, a sul do paralelo das Canárias, apresentando como fundamento jurídico para as suas teses - ainda que dentro de um grande erro geográfico - a doutrina do Mare Clausum, que obrigaria, caso tivesse razão, a Espanha a devolver as terras visitadas por Colombo.
Em termos de direito internacional, este tratado assinala o momento de consagração do domínio e privilégio exclusivo de navegação nos mares a certos países: o Mare Clausum. Todavia, no direito clássico o mar é comum, pertence a todos, não é territorializado. Já no sul de Itália, antes do ano 1000, se reclamava o Mare Clausum, como o fizeram também depois Génova, Veneza, reinos nórdicos e até a Inglaterra por vezes, na Idade Média, quando impunham taxas de passagem, monopólios de pesca e até bloqueios a navios estrangeiros nos seus mares. Portugal e Espanha, nos séculos XV e XVI, estenderão esse conceito de "mar fechado" para além dos mares europeus, alargando-o a outros oceanos e regiões entretanto descobertas, assegurando fluxos comerciais seguros e rentáveis, essenciais para as suas economias mercantilistas, baseadas na estabilidade dessas rotas. Leis, diplomas, de tudo se serviram os monarcas ibéricos para legitimar essa supremacia marítima e os exclusivos de navegação e comércio, resgatando os navios que se atrevessem a navegar nesses espaços marítimos.A própria titulatura dos reis portugueses, por exemplo, denuncia a pretensão ao exclusivo dos mares e aos seus lucros. Assim, era comum que se intitulassem Senhores da navegação da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, por exemplo, entre outras expressões. Os papas ajudam ainda mais a reforçar essas pretensões do Mare Clausum dos reinos peninsulares: o papa Nicolau V, na bula Romanus Pontifex, em 1455, proíbe a navegação nos mares exclusivos dos portugueses sem autorização do rei de Portugal. D. João II, como D. Manuel I, bem como os Reis Católicos e Carlos V em Espanha, consagrarão o princípio do Mare Clausum e dar-lhe-ão a sua maior amplitude e universalidade, baseados em justificações jurídicas e filosóficas, para além de castigos para quem ousasse usurpá-lo. As Ordenações Manuelinas e as Filipinas em Portugal são disso um verdadeiro exemplo. Este princípio pressupõe, igualmente, o domínio militar dos mares e a colonização das regiões adjacentes. Com o aparecimento dos holandeses, ingleses e franceses nos mares a reinvindicarem e a apoderarem-se pela força e pelo corso de rotas, produtos e colónias, através das suas companhias de privilégio (comerciais), com objetivos militares e expansionistas, põem em causa o Mare Clausum ibérico, que perde sentido com a união ibérica de 1580 e, principalmente, com o desmantelamento da frota espanhola (e portuguesa) na derrota pesada da Armada Invencível em 1588 às mãos dos ingleses. Estes, ainda que fossem claramente contra o Mare Clausum, acabaram por aplicá-lo relativamente ao Canal da Mancha e ao Mar do Norte no século XVI e mesmo, noutras ocasiões, nas suas colónias.
Os portugueses enfrentaram, desde o início dos Descobrimentos, a cobiça castelhana, cuja Coroa reinvindicava a posse de algumas das terras descobertas pelos navegadores ao serviço do rei de Portugal. A questão da posse das Canárias é o caso com maior expressão das querelas territoriais luso-castelhanas. A sua posse, decidida a favor de Castela, apenas se legitimará no Tratado de Alcáçovas. Nesse mesmo encontro entre os dois países, em 1479, demarcaram-se também as zonas marítimas de Portugal e de Castela. Assim, as terras descobertas a sul das Canárias ficariam para Portugal, que passava a deter igualmente o exclusivo do comércio na região, ficando Castela com idênticas condições mas a norte daquele arquipélago atlântico. Sanavam-se os conflitos entre os dois reinos e findava a ingerência castelhana na Guiné e seu comércio.Afirmava-se, por outro lado, o princípio do Mare Clausum (mar fechado), que consagrava e reservava o direito de posse e navegação a quem descobrisse qualquer terra ou rota marítima. O Tratado de Tordesilhas, em 1494, dois anos após a chegada de Colombo à América, irá reforçar o princípio do Mare Clausum saído do Tratado de Alcáçovas. Assim, entendem as monarquias ibéricas, revendo as posições assumidas em 1479, dividir o mundo pelos seus dois reinos a partir do meridiano que passa a 370 léguas a ocidente do arquipélago de Cabo Verde. A oeste desse meridiano, ficariam as possessões espanholas; a leste, as portuguesas.Este esforço clarificador que foi o Tratado de Tordesilhas resultava das reivindicações portuguesas em relação aos territórios que Colombo teria descoberto em 1492 ao serviço dos Reis Católicos de Espanha. D. João II de Portugal afirmava, então, que essas terras se situavam, à luz das conclusões de Alcáçovas, a sul do paralelo das Canárias, apresentando como fundamento jurídico para as suas teses - ainda que dentro de um grande erro geográfico - a doutrina do Mare Clausum, que obrigaria, caso tivesse razão, a Espanha a devolver as terras visitadas por Colombo.
Em termos de direito internacional, este tratado assinala o momento de consagração do domínio e privilégio exclusivo de navegação nos mares a certos países: o Mare Clausum. Todavia, no direito clássico o mar é comum, pertence a todos, não é territorializado. Já no sul de Itália, antes do ano 1000, se reclamava o Mare Clausum, como o fizeram também depois Génova, Veneza, reinos nórdicos e até a Inglaterra por vezes, na Idade Média, quando impunham taxas de passagem, monopólios de pesca e até bloqueios a navios estrangeiros nos seus mares. Portugal e Espanha, nos séculos XV e XVI, estenderão esse conceito de "mar fechado" para além dos mares europeus, alargando-o a outros oceanos e regiões entretanto descobertas, assegurando fluxos comerciais seguros e rentáveis, essenciais para as suas economias mercantilistas, baseadas na estabilidade dessas rotas. Leis, diplomas, de tudo se serviram os monarcas ibéricos para legitimar essa supremacia marítima e os exclusivos de navegação e comércio, resgatando os navios que se atrevessem a navegar nesses espaços marítimos.A própria titulatura dos reis portugueses, por exemplo, denuncia a pretensão ao exclusivo dos mares e aos seus lucros. Assim, era comum que se intitulassem Senhores da navegação da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, por exemplo, entre outras expressões. Os papas ajudam ainda mais a reforçar essas pretensões do Mare Clausum dos reinos peninsulares: o papa Nicolau V, na bula Romanus Pontifex, em 1455, proíbe a navegação nos mares exclusivos dos portugueses sem autorização do rei de Portugal. D. João II, como D. Manuel I, bem como os Reis Católicos e Carlos V em Espanha, consagrarão o princípio do Mare Clausum e dar-lhe-ão a sua maior amplitude e universalidade, baseados em justificações jurídicas e filosóficas, para além de castigos para quem ousasse usurpá-lo. As Ordenações Manuelinas e as Filipinas em Portugal são disso um verdadeiro exemplo. Este princípio pressupõe, igualmente, o domínio militar dos mares e a colonização das regiões adjacentes. Com o aparecimento dos holandeses, ingleses e franceses nos mares a reinvindicarem e a apoderarem-se pela força e pelo corso de rotas, produtos e colónias, através das suas companhias de privilégio (comerciais), com objetivos militares e expansionistas, põem em causa o Mare Clausum ibérico, que perde sentido com a união ibérica de 1580 e, principalmente, com o desmantelamento da frota espanhola (e portuguesa) na derrota pesada da Armada Invencível em 1588 às mãos dos ingleses. Estes, ainda que fossem claramente contra o Mare Clausum, acabaram por aplicá-lo relativamente ao Canal da Mancha e ao Mar do Norte no século XVI e mesmo, noutras ocasiões, nas suas colónias.
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